sábado, 25 de maio de 2013

Conselhos de uma recém-formada experiente


A jornalista Thaise Constancio conta seus primeiros passos na profissão e avalia a formação da UFF 


Patrícia Fernandes

Com apenas 25 anos, Thaise Constancio já conquistou seu espaço no competitivo mercado jornalístico e se tornou referência para futuros jornalistas. Atualmente, participa do programa de trainee do jornal O Estado de S. Paulo e foi uma das convidadas do último Controversas, na mesa “Prata da Casa”, com recém-formados em Comunicação Social/Jornalismo na UFF que se destacam em suas áreas de atuação. Com experiência também em comunicação corporativa e assessoria de imprensa, Thaise já trabalhou em empresas públicas e privadas, além de ter conhecimentos em web, TV e jornalismo impresso.

Você pode falar um pouco sobre sua vida acadêmica e profissional? Consegue encontrar uma relação entre as duas e acha que a UFF representa algum tipo de link especial entre elas?
A UFF foi essencial, foi lá que eu me formei, conheci os amigos com quem trabalho hoje, consegui meu emprego. Então, ela foi essencial, tanto pra minha vida pessoal quanto profissional. Engraçado que, quando você está na faculdade, não percebe que tudo o que está aprendendo faz sentido.Agora que eu saí da faculdade, vejo que faz todo o sentido estudar Teoria da Comunicação [risos], faz todo sentido estudar o mínimo de Economia, Filosofia... A UFF tem essa coisa de fazer você pensar e isso é bom porque você se torna uma pessoa mais crítica e observa coisas que, às vezes, as pessoas não observam.
Em relação à minha vida profissional, eu fiz quatro estágios durante a faculdade e ser aluna da UFF é importante, não é a única coisa, mas realmente pesa no currículo. Todas essas experiências vão somando alguma coisa. E tudo isso sempre ligado à UFF porque foi lá que eu aprendi que a gente tem que fazer, que nada vai chegar ao seu colo sem você se esforçar.


"Agora que eu saí da faculdade, vejo que faz todo o sentido estudar Teoria da Comunicação [risos], faz todo sentido estudar o mínimo de Economia, Filosofia... A UFF tem essa coisa de fazer você pensar e isso é bom porque você se torna uma pessoa mais crítica e observa coisas que, às vezes, as pessoas não observam."


Se você fizesse uma lista sobre as contribuições positivas e negativas da UFF para sua vida profissional, quais seriam os principais tópicos?
De positivo, foi isso de me virar, de não parar no “não”, sempre melhorando para evoluir até chegar ao sim,. Nunca parar no primeiro não; essa coisa de correr atrás. De negativo, eu acho que se eu não tivesse me esforçado, eu não teria aprendido pela dificuldade técnica. Dificuldade acadêmica, eu acho que não tive muita, os professores sempre foram muito abertos e até hoje a gente mantém contato por Facebook, e-mail... Meu emprego na Cajá (anterior ao de trainee no Estadão) eu consegui através de um professor. Então isso é bem positivo.

Como trabalho de conclusão de curso, você optou por realizar um projeto prático, a reportagem especial “Da África para o Brasil” sobre as experiências de imigrantes de regiões da África para o nosso país. Você pode falar um pouquinho sobre isso: o que motivou a escolha pela reportagem, pelo tema, já que é mais comum falar sobre brasileiros que vão para outros países, do que sobre estrangeiros vindo para o Brasil, e como foi o processo?
Bom, eu decidi fazer um projeto prático porque achei que ia ser mais fácil. Doce ilusão [risos]. E eu achei que uma reportagem ia ter duas vantagens: primeiramente eu poderia falar, porque quando você faz uma monografia, você tem que juntar pessoas pra dizer o que você quer dizer e na reportagem era eu falando, aquilo que eu colhi, essa foi a primeira coisa. E a segunda coisa foi que eu tava fazendo jornalismo, eu queria escrever, não queria fazer uma coisa quadrada, e aí eu fiquei pensando no tema. Eu fui fazer uma matéria para a editoria de internacional no JB. Foi uma época em que estava havendo muito problema na Europa em relação aos imigrantes, com muitos protestos dos europeus contra os imigrantes e dos imigrantes contra os europeus.

"Bom, eu decidi fazer um projeto prático porque achei que ia ser mais fácil. Doce ilusão."


Eu entrevistei um professor de História Contemporânea que estava nos Estados Unidos e ele falou:  “Ah, o Brasil nunca vai entrar em uma comunidade como a União Europeia com africanos, porque a quantidade de gente que virá para o Brasil, se for uma comunidade de livre circulação de pessoas, será imensa. Muitos africanos virão pra cá, aí a gente vai ter problemas econômicos, sociais...”. Isso me deu um estalo. Fiquei me perguntando o porquê disso e decidi pesquisar. 
E aí comecei a conversar com as pessoas. Eu tenho uns amigos na UFRJ, lá eu conheci muita gente, selecionei alguns para a minha primeira parte. Eu me inseri no mundo deles. Eu ia aos eventos que eles organizavam, conversava com eles, nós nos tornamos amigos de verdade... Eu não queria que eles conversassem comigo como fariam com um estranho.

Como foi esse processo?
Outra coisa que eu queria fazer era contar histórias, eu queria deixar eles falarem, porque eu acho que muito mais interessante ler a história de um alguém contada por ele mesmo do que ler a história de um alguém com a visão de uma terceira pessoa que não sabe como foi aquilo. A monografia também tem brasileiros que se veem, ao mesmo tempo, como brasileiros e como africanos. Isso foi uma coisa que eu só descobri que seria interessante enquanto eu estava lá, fazendo. Então, mesmo tendo uma ideia do que eu queria fazer, eu tentei manter meu olhar aberto e eu acho que isso foi uma coisa bem legal.
As pessoas têm uma visão muito estereotipada (dos africanos), essa foi uma barreira que eu tive que quebrar também. Eles são pessoas normais, muito parecidas com a gente. Da mesma forma que a gente sai do Brasil para estudar nos Estados Unidos, eles saem de um país mais pobre para estudar no Brasil. O Brasil é o primo rico. Isso foi uma coisa que eu aprendi com eles. Eles não vivem na selva. [risos] Eles não saem correndo atrás de um leopardo e um leopardo atrás deles. Eles vivem nas mesmas condições que a gente. Eu conheci uma menina que ganhou uma moto quando passou no vestibular. É muito próximo da nossa realidade e eu tentei trazer isso. Mais do que uma “obrigação acadêmica”, foi uma experiência pessoal.

"Eu acho que todo mundo que faz jornalismo tem que ter essa experiência. Por mais que você vá ficar um mês na redação e falar “gente, eu não nasci pra isso”, é importante."


Sua reportagem foi convidada a representar a UFF na etapa regional da Expocom. Você planejava um direcionamento acadêmico para a sua carreira? Como foi participar de algo tão grandioso, representando sua universidade e, especialmente, com um trabalho que você produziu?
Achei muito legal. Primeiro porque deu muito trabalho pra fazer, mas, ao mesmo tempo, foi muito bom. Então estender, ir além da monografia, foi bom. Além disso, representar a UFF também. Eu aprendi tudo ali e não era só o meu nome que estava em jogo, eu tava levando o nome da universidade para o Sudeste. Uma coisa que eu aconselho pra todo mundo, que eu não fiz, mas eu acho legal: se tem uma coisa da qual que você gosta, ponha isso como uma forma de se mostrar. Por exemplo, se gosta de música, faça um blog sobre o assunto. Primeiro você tá se exercitando. Segundo, conta profissionalmente pra você, porque as pessoas estão te vendo. Você vai fazer uma entrevista de emprego e o cara vai jogar seu nome no Google e ter alguma coisa de volta. Então, se mostra mesmo.

Falando um pouco sobre o início de sua carreira. Seu perfil na rede social Linkedin mostra que você já estagiou em empresas diferentes e todas bem importantes, especialmente na área de Comunicação, como a Superintendência de Seguros Privados (Susep), a Fundação Roberto Marinho, o Jornal do Brasil e Furnas, além de ter conhecido áreas diversas. Você pode falar um pouquinho sobre essas experiências: como tudo começou, se planejou tudo isso e o que você tirou de cada uma?
Não, eu só planejei ter experiência em rádio, que eu nunca tive [risos]. Na Susep, eu me inscrevi no programa diretamente, fiz a entrevista, minha chefe gostou de mim, foi com a minha cara [risos]. E eu sempre pergunto porque a pessoa me escolheu. Nesse caso, minha chefe disse que achou que era importante eu ter uma experiência em economia. A ideia é seguir por esses nichos que ninguém quer, porque é aí que você vai crescer.
Eu passei seis meses lá, ia ficar mais, só que eu vi o processo seletivo da Fundação Roberto Marinho... Depois que eu passei na prova, fiz a entrevista e fui chamada. Eu perguntei porque e minha chefe disse: “você precisava de uma experiência internacional, eu achei que você precisava ter um nome de peso, reconhecido”. Lá eu fiquei de apoio e o que eu fazia de jornalístico, eu tinha que me jogar, ficar até mais tarde para acompanhar a produção, as externas, a edição, mas tudo bem, eu estava lá pra aprender. Então eu pedi pra mudar (de área), tinha uma vaga, mas não me deixaram ir porque eu não tinha experiência. Aí é a bola do mercado: tem que ter experiência, mas ninguém te dá experiência.

Como foi o ingresso para o JB?
Uma amiga estava sendo contratada no JB e a vaga dela de estagiária ia vagar. Eu fui lá, fiz entrevista, e a redação para admissão era escrever uma matéria pequena. Então ele (o selecionador) falou “ah, você vai sair de um lugar estável, onde tem fim de semana, trabalha quatro horas por dia, pra vir para o JB que está em processo de falência, onde as pessoas não estão recebendo, pra trabalhar, no mínimo, seis horas por dia?”. E eu falei que precisava ter essa experiência em redação. Eu acho que todo mundo que faz jornalismo tem que ter essa experiência. Por mais que você vá ficar um mês na redação e falar “gente, eu não nasci pra isso”, é importante.Do JB eu fui pra Furnas. Lá eu tinha tempo, podia descarregar minhas energias pra procurar coisas para o TCC, então foi bom. Toda a energia que eu aprendi a ter no JB, eu concentrei em uma coisa que eu queria muito fazer, que foi o TCC.

Você foi construindo uma expertise em diversas áreas, como comunicação corporativa, assessoria de imprensa, webjornalismo e telejornalismo. Alguma delas te atrai mais? Se sim, tem um motivo mais racional ou é algo mais pessoal, uma identificação não planejada?
Bom, eu gosto mais de redação, porque tudo é muito rápido, muito dinâmico. E agora, cada dia eu aprendo uma coisa, eu preciso transformar aquelas informações técnicas em uma coisa que todo mundo vai entender e esse processo me atrai muito. Está sempre somando à minha experiência pessoal, profissional, para eu ter um pouquinho a mais do que outras pessoas. Sempre tem a ver com o “correr atrás”.

"Quando eu entrei na faculdade as pessoas falavam “ah, desiste, o mercado tá saturado”, “não sei por que você vai tentar isso”, “vai tentar uma coisa que dá dinheiro”... Mas eu gosto muito daquilo que faço, sou apaixonada mesmo pelo que eu faço, é mais fácil."


Fale um pouco sobre sua apresentação na mesa "Prata da Casa", no último Controversas. A proposta desse grupo de palestras é mostrar aos ex-alunos que eles podem ser uma inspiração para a geração seguinte. O que você achou de retornar à universidade? Você considerou que era vista como inspiração e, ao mesmo tempo, uma espécie de autoridade e um orgulho para os estudantes que te assistiram?
Isso é muito louco também. Eu pensei “cara, eu acabei a faculdade ontem”. Eu fiquei duas semanas pensando no que eu ia falar e não consegui desenvolver alguma coisa certa. Foi então que pensei “vou chegar lá e falar que nem uma louca”, que é o que eu faço normalmente [risos]. E essa questão de referência, isso é muito louco... Você tá tocando a sua vida normalmente e não faz as coisas pensando que alguém está se espelhando em você. Eu pensei, “poxa, já estive lá, nessa situação...”. E eu consegui certas coisas, então eu fui pra contar e espero ter ajudado, pelo menos ter dado uma luz.
Quando eu entrei na faculdade as pessoas falavam “ah, desiste, o mercado tá saturado”, “não sei por que você vai tentar isso”, “vá tentar uma coisa que dá dinheiro”... Mas eu gosto muito daquilo que faço, sou apaixonada mesmo, é mais fácil.

"Tudo que você vai aprendendo está somando, isso é o mais legal, porque o aprendizado vem sem você perceber e um dia você vai colocá-lo em prática"


Então, se você fizer uma coisa que gosta e faz bem, você vai ganhar dinheiro. O mercado tá saturado? Tá. O mercado tá saturado de gente ruim, mas você é da UFF, você passou por um processo bizarro, competindo com o país inteiro e garantiu sua vaga em uma universidade pública reconhecida nacional e internacionalmente. Então você é bom, já é bom a partir daí.

O que diria em relação aos professores?
Você tem contato com professores que passaram por um concurso público bizarro, são doutores, têm experiência no mercado. Então, você não sabe, mas está muito à frente de muita gente, juntando muita coisa.
Um dia você vai ver “a Larissa falou que tem que prestar atenção com o que escreve no Facebook”, e um dia você vai ver alguém escrevendo alguma besteira e vai falar “olha lá”. Alguém falou que você tem que ter uma visão crítica, e você vai dizer “que droga de visão crítica é essa?”. Aí, um dia, você vai entrevistar a Dilma. Você vai ter uma visão crítica, você não vai conseguir entrevistar o presidente da República sem ter uma visão crítica. Então tudo que você vai aprendendo está somando, isso é o mais legal, porque o aprendizado vem sem você perceber e um dia você vai colocá-lo em prática. Um dia vai aparecer a Silvia [Moretzsohn] gritando no seu ouvido “ah, olha o que você tá fazendo” [risos].

Entrevista realizada pela estudante de jornalismo da UFF Patrícia Fernandes em 8 de março de 2013, na Livraria da Travessa, no Centro do Rio de Janeiro, e editada em 17 de março de 2013.

domingo, 19 de maio de 2013

Plínio Fraga e o jornalismo de raiz



Jackeline Chagas e Natasha Dias
           
A conversa com o jornalista Plínio Fraga, de 45 anos, começou com um desabafo: “Vida de jornalista é uma correria só. Achei que fosse conseguir escrever meu livro e continuar trabalhando no O Globo, mas cheguei à conclusão de que não vai dar”, disse, dias antes de deixar o jornal para dedicar-se à escrita da vida de Tancredo Neves, em fevereiro deste ano. Antes do O Globo, onde trabalhou no último ano, passou pela revista Piauí, pelos jornais Folha de S. Paulo e Jornal do Brasil, ora na Política, ora na Cultura.


Ele contou o começo de sua carreira, ainda no tempo da máquina de escrever; falou sobre as dificuldades que enfrentou – como as ocasiões em que precisou bater de casa em casa pedindo que lhe emprestassem um telefone para mandar matérias para a redação – e destacou a diferença de se escrever para uma revista e para um jornal. As dificuldades não abalaram seu amor pela profissão: “Eu sempre quis fazer jornalismo, nunca imaginei fazer outra coisa”, afirmou o convidado da mesa sobre Jornalismo Literário do último Controversas.

Você nasceu em 1968, ano em que a ditadura estava forte no Brasil e entrou para a faculdade de jornalismo dois anos após seu fim. Houve alguma influência do regime na sua escolha pelo jornalismo?
Não. Sabe que isso é até engraçado, eu nasci no dia 5 de dezembro e o Ato Institucional n° 5 foi decretado no dia 13 de dezembro. Em 1984 eu participava das campanhas das Diretas Já, desde jovem eu sempre gostei muito de política. Entrei na faculdade em 1987 e a nossa turma montou uma chapa para concorrer ao Diretório Acadêmico, mas por incrível que pareça a gente queria vencer para diluir o diretório. A gente não queria colocar nada no lugar, só queria tirar quem estava lá, porque eles eram muito chatos. Na minha época o que todo mundo queria fazer mesmo era poesia. O Brasil tinha acabado de ter uma decepção forte com a política, derrotas nas Diretas e logo depois a eleição e morte do Tancredo. O país tinha saído da ditadura, mas a crise aumentou. Politicamente estava tudo muito confuso e as pessoas estavam um pouco perdidas. Eu sempre quis fazer jornalismo, nunca imaginei fazer outra coisa. Desde os meus 12 anos lia pelo menos uns dois jornais por dia. Acredito que a ditadura não tenha muita relação com isso, talvez tenha com minha formação de gostar de ler.

Que mudanças no jornalismo você percebeu ao longo de sua carreira?
São várias mudanças, algumas mais diretas e outras mais indiretas. Eu comecei a trabalhar em 1989 e já e passaram 24 anos desde então. Naquela época, a gente escrevia a matéria em lauda, na máquina de escrever, mas já existia o fantasma das redações informatizadas. Quando eu entrei na Folha, em 1990, foi a primeira vez que eu escrevi uma matéria no computador. Eu achava aquilo sensacional e olha que eram aqueles computadores enormes. Me lembro também que, quando o repórter viajava pra fazer reportagem,  tinha que ir acompanhado de um fotógrafo e um laboratorista, porque era preciso revelar o filme, e muitas vezes as cidades não tinham laboratórios. O laboratorista viajava com umas malas grandes porque tinha que levar vários produtos químicos e o equipamento. Ele transformava o quarto em um laboratório, ficava tudo escuro e um cheiro forte de química. Para mandar as fotos para a redação demorava cerca de 40 minutos. Outra coisa engraçada é que em 1992 quando já havia laptop para levar em viagens, mas a conexão à internet dependia da conexão discada, eu escrevia as matérias e batia de casa em casa perguntando se alguém poderia me emprestar o telefone. Muitas vezes eu acabava desmontando o telefone da pessoa pra poder colocar o cabo no meu laptop e enviar a reportagem para a redação. Já desmontei muito telefone na casa dos outros.

Você foi convidado para uma mesa sobre jornalismo literário no Controversas. Como você enxerga a literatura influenciando no seu trabalho?
Jornalismo é talento e não inspiração, ou seja, quanto mais você trabalhar, quanto mais você se dedicar a uma entrevista, a apurar, melhor a sua matéria fica. A literatura te proporciona ritmo narrativo, vocabulário, ampliar sua capacidade de entendimento de mundo, criatividade, coisas que você precisa para escrever um bom texto. Mas a literatura não te dá a técnica jornalística, que é fundamental. Eu nunca fui muito a favor do termo jornalismo literário, porque jornalismo é uma coisa e literatura outra. Normalmente um bom jornalista não consegue ser um bom romancista e vice-versa, os dois trabalham com registros diferentes.

As chefias têm resistência em dar lugar a textos mais bem trabalhados ou cobram o estilo convencional, mais imediatista?
Não é que as chefias resistem à ideia em si. Um texto nos padrões que entendo como sendo adequado para desenvolvimento de certas ferramentas mais utilizadas na literatura demanda investimento. Depende também de tempo de apuração, muitas vezes de dinheiro em viagem, pesquisa rigorosa, busca de documentos. É um processo mais complicado, lento, de respostas às vezes não muito claras. Em geral, chefes optam por soluções mais imediatas em razão da natureza do jornalismo. A urgência dos prazos é um dos nossos limites. Mas bons chefes sabem fazer escolhas, sabem que certas histórias merecem mais tempo, mais paciência, mais orçamento e repórteres mais experientes.

Política e Cultura são duas editorias bem diferentes. O que te atrai nos dois segmentos? 
São diferentes quando olhadas pelo varejo das notícias. Elas têm em comum o fato de traçarem o confronto de ideias, pensamentos, linhas macroestruturais. São delineadoras de futuro, explicadores do passado. Muito da arte pode ser política, muito da política pode ser uma espécie de arte, em termos de articulação, mediação, discurso.

Atualmente o jornalismo acaba sendo cada vez mais imediatista e não há muito espaço para as grandes reportagens. Quais consequências isso pode trazer?
O leitor imediatista é muito bem servido pela velocidade com que as informações circulam. A quantidade dessas informações está em um nível tal que acho que confunde as pessoas. Esse ambiente estimula quem possa ajudar na organização e reflexão das ideias do nosso tempo. Isso pode ser feito de muitas formas. Tem a longa e a curta, a inteligente e a chata, a pedante e a clara, a articulada e a rarefeita. É nesse momento que atuam o bom repórter e o bom editor. É aqui que a profissão faz sentido.

 Quais as diferenças entre escrever para uma revista como a Piauí e um jornal como a Folha ou O Globo?
Uma revista como a Piauí tenta ir justamente nos espaços que jornais e outras revistas deixam abertos. Ela é uma revista mensal, tenta se aprofundar em assuntos que outros veículos não abordam. São textos longos de 25 mil a 40 mil toques, com prazos longos de apuração. Nos jornais depende. Eu já fiz matérias na Folha que demoraram de dois a três meses, mas isso é uma excepcionalidade. No geral, os prazos são infinitamente menores. As pesquisas hoje mostram que as pessoas têm em média 30 minutos para ler o jornal por dia. Talvez no jornal de domingo você gaste mais tempo. Sua relação com o jornal é diferente da sua relação com a revista. A revista mensal você lê por dias, já o jornal você lê hoje e amanhã já tem outro. Acho que os jornais precisam de grandes narrativas, e precisam de editores que digam que nem tudo vale grande narrativa.

Como você vê a maior interação com o leitor, proporcionada pela internet? Ela influi no seu trabalho? Você costuma estabelecer algum tipo de troca com o público?
Há dois tipos de comentários. Aqueles que estão no site do O Globo, eu não leio porque as pessoas não se identificam, usam pseudônimos, são agressivas. Os enviados por pessoas que te mandam mensagem por e-mail, eu leio. Os leitores, às vezes, são questionadores e dizem no que você errou. Se é uma dúvida, eu explico, se for erro meu, eu assumo, não vejo problema nenhum nisso. Quando mandam e-mail pedindo mais informações, eu dou. Isso eu acho bom, o que eu não gosto são aqueles comentários do site em si, aquela selvageria. Isso pra mim não é interatividade. Quando os jornais colocaram aquela bagunça no site, aquele Fla x Flu político e as pessoas te xingando, sob anonimato, não acho que haja um debate de ideias. Essa política é meio falsa, é a falsa interatividade. Se eu quero comentar uma notícia que está no jornal, eu tenho que me identificar. Sob o codinome 'gostosão68' não dá.

Muito se comenta sobre a ética do jornalista e até que ponto ele pode chegar para escrever uma matéria. Temos como exemplo a cobertura da tragédia em Santa Maria. Em sua opinião, quais são os limites de um jornalista? 
A ética é comum, você não pode distorcer, não pode mentir. Eu sou contra qualquer tipo de mentira. Sendo jornalista, nunca obtive informação dizendo não ser jornalista. Não significa que eu não possa não me identificar, mas a partir do momento que sou questionado como tal, eu digo que sou jornalista e ponto. Não vou mentir e dizer que sou policial. O país tem regras, leis. Formalmente, se eu publico um grampo, eu estou quebrando a lei, mas se for de interesse público tem uma regra maior aí, tem um sentido. Mas não posso roubar um documento, por exemplo, em benefício da minha reportagem. Não posso contratar araponga pra investigar as pessoas. Os jornalistas devem usar os meios jornalísticos para investigação. Jornalista é uma pessoa como qualquer outra, eu não tenho que ter privilégio.

Qual a sua visão do jornalismo hoje? Quais pontos você acha que deveriam melhorar?
O básico do jornalismo é a informação bem apurada, bem trabalhada e bem editada. É assim há 300 anos. Bons profissionais, bem formados e que saibam trabalhar a informação. Isso depende da base. A necessidade da informação bem apurada que a sociedade precisa e você tem, não vai ser suprida por blog ou coisas do tipo. A sociedade quer bons jornalistas e um bom jornalismo.

O que você acha da formação acadêmica em jornalismo? É importante?
Não me arrependo de ter feito (Jornalismo). Não sou favorável, para não ser linchado, que os jornais contratem só formados em jornalismo, mas é bom que hajam outros profissionais, mesmo que sem diploma, trabalhando na nossa área também. Eu trabalhei com gente formada em Direito, Economia, e faz uma puta diferença. Coisas que não dão certo em profissão nenhuma são: preguiça, pouca dedicação, arrogância de achar que não precisa ouvir as pessoas e autossuficiência. Toda vez que você acha que já sabe demais, se dá mal. Toda vez que você deixa de fazer algo que deveria ter feito, se dá mal. Não é uma profissão pra se ganhar muito dinheiro. Se for pensar nisso por dinheiro, vai fazer outra coisa. Vai sempre ter altos e baixos, felicidade e tristeza, vai trabalhar muito, vai perder namorados(as), férias, finais de semana. Você vai ter que fazer escolhas.

Que conselho você daria aos estudantes de jornalismo?
Leiam jornais, revistas, livros sempre. Tem gente que gosta de cultura e lê só cultura. Recomendo que leiam de tudo, pois é isso que vai te dar instrumento pra entender como se faz (jornalismo). É lógico que se você gosta mais de cultura, você tende a ler mais sobre isso, mas você deve ter um conhecimento amplo. Ter curiosidade, ser interessado no humano, no sentido físico e no que o humano produz. 

sábado, 18 de maio de 2013

Controversas 2013.1 a caminho...

Enquanto o próximo Controversas ainda está no forno, vamos nos deliciar com uma série de textos produzidos por alunos do curso com os participantes do evento anterior.

Aguardem, o Controversas 2013.1 vem cheio de novidades e informação pra vocês!